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Rebeubeu, Pardais ao ninho

Rebeubeu, Pardais ao ninho

Fevereiro 14, 2020

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Hoje, dia dos namorados e, coincidentemente, aniversário da primeira noite que passámos nesta casa, foi o dia em que eu percebi: já não há volta a dar.

Nunca tivemos a conversa sobre viver juntos. Aconteceu. Fiquei uma noite aqui, uma noite ali, até repararmos que eram já muitas noites de seguida e que surgia agora a necessidade de lavar roupa. Necessidade essa que nos levou a misturar cuecas, peúgas e soutiens num tambor da máquina que se encontra ao fundo da cozinha desta casa.

O João já lá tinha vivido vários anos. Com outra pessoa, antes de mim. Talvez por isso, talvez pelos muitos vestígios dessa presença na casa, dormir ali nunca me deu a segurança que senti hoje: já não há volta a dar.

O João foi um dos muitos contemplados com uma carta do senhorio que, por outras palavras, informava que este queria melhor rentabilizar o seu bem escasso: uma habitação em Lisboa. Já eu, era, e sou, já proprietária duma casa, fora de Lisboa e que, automaticamente, implica uma carga mensal muito menor. Decidimos mudar. Sempre quis voltar para esta casa, não desde que estamos juntos, mas desde que fui viver para o estrangeiro, há 9 anos.  Talvez por isso e pelo facto de não ter havido ali nunca nenhum coabitante que integrasse outro par amoroso que não o nosso, acho que esperávamos os dois que fosse nesse momento, da decisão ou da mudança, que eu percebesse; já não há volta a dar.

Foi hoje, dia dos namorados e, coincidentemente, no aniversário da primeira noite que passámos ali que, enquanto corria pela casa, já atrasada, a despachar-me para o trabalho que olhei de soslaio para a única das 137 caixas que o João já preparou para as mudanças. Uma caixa com muitos, mas apenas alguns dos muitos livros que temos. Os que estavam na estante ao canto da divisão a que chamamos escritório, mas que usamos, sobretudo, para estender roupa. Ficam a faltar os livros na estante igual que se encontra na entrada da casa, os livros que pusemos em cima da sapateira, os livros que estão em cima da cómoda no quarto, os livros nas mesas de cabeceira e os livros espalhados algures pela sala.

Olhei para essa caixa, com uma tão pequena parte dos nossos muitos livros e percebi: já não há volta a dar. Já não sei quais são os meus, quais são os dele, quais são os nossos.

Não consigo imaginar a dor de decidir quem fica com Saramago, quem leva Margareth Atwood. Não consigo imaginar a dor duma partilha de bens que se foram adquirindo numa vida que se adivinha comum. No nosso caso são os livros. Os dele, os meus e os nossos: já não há volta a dar.

 

 

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